As Coisas Que Eu Gostaria de Falar Sobre Com a Olga
Falei com Olga hoje. Falei mentalmente e lhe contei sobre você. Ela não me escutou, porque não está escutando mesmo, e a culpa é todinha minha.
Agora estou aqui, sentada num café, ouvindo a lista de músicas que me lembra você. Cappuccino com muito açúcar, não é? Para acordar, despertar, ressuscitar. E eu fecho os olhos e sinto o nada passando por mim. Acho que nem sangue por dentro tem aqui. Cavamos um buraco, pequena. Cavamos e nos escodemos lá dentro, e os demônios lá de cima jogaram a terra por cima de nós. E agora estamos aqui: asfixiadas, sem saída. Presas num lugar que antes era nosso porto seguro. E como não seria mais?
Não entendo como estamos tão tristonhas ao estar juntas. O que sempre foi um motivo de sorrisos vai lentamente se dilacerando e sendo comido pelas pragas. Pragas que nunca dariam no nosso jardim, se dependesse de nós. Mas não depende. E deram. E ficaram. E comeram tudo. E agora nem toda a fertilidade do mundo conserta o que elas fizeram. Gafanhotos. E vespas...
Vespa, é isso. É uma picada de vespa. Inchada, enorme, doendo tanto que talvez fosse até melhor me levar ao hospital. Mas eu não vou, de teimosa, e peço para os outros me melarem de pomada para ver se sara logo. Mas eles têm nojo do machucado, da ferida, e do pus. Então me resta só pedir a você, mas você tem medo de me infectar com seus dedos sujos de passados. Então fico aqui, com a ferida, sem cura alguma, porque deixar tudo pra trás e pedir pra outro alguém cuidar eu não vou. Não mesmo... Não vou.
O que me rodeia é só você. Ontem fui àquela cafeteria semelhante à em que dividimos um croissant de chocolate, e pediram meu nome para anotarem meu pedido. Eu dei nome falso, como sempre costumava dar, e, sem perceber, foi o seu que saiu da minha boca. O nome nosso, da nossa filha (que não íamos ter). Ela seria bonita como Madu, aquela menina que joguei pra cima na presença da minha mãe, mas seria ruiva. E seria nossa, como aqueles animaizinhos que eu tão crente de mim planejei. E nós conseguiríamos conciliar ratos, e gatos, e peixes! Ai, ai, essa é a única exclamação que há de sair de mim no texto todo. Ando tão, tão sem emoção. Apática. Sem solo, sem sono.
A próxima vez que você colocar os olhos em mim, tenha a certeza que vou parecer distante.
As palavras vão se acumulando, mas só há um significado. Só um... E o que eu quero dizer é que preciso ser resgatada desse poço em que me encontro. E vou cada vez afundando mais, sem perceber, só tomando as escolhas erradas, porque meu corpo já não sabe mais o que é esquerda, o que é direta, muito menos o que é direito.
Preciso da sua mão aqui na minha mas hoje você não quis me ver. E tudo bem. Tudo bem – eu suspiro pra mim mesma – e dou o último gole no copo de bebida quente. Depois pago as contas, levanto e vou embora. Porque me ensinaram que é assim que se faz.